Sepulcro

"Os amores são como impérios: desaparecendo a ideia sobre qual foram construídos, morrem junto com ela" - Milan Kundera

 

No Toshiba preto, um CD deixado por quem me jurou fidelidade revela cadáveres de culpas que soterrei com destilados e fermentados.
 

Me exponho, te exumo, não te eximo, mas te exílio de mim. Ainda lembro quando ficou claro para ambos o quão errado nossa união se desenhava, culminando em nosso assassinato.
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"Querida, veja bem: há acusados e acusadores, mas nunca seremos mandados ao banco dos réus. Vamos nos sentenciar a solidões individuais do que uma compartilhada", dizia a abertura de algum Nouvelle Vague. Instintivamente nos entreolhamos, como se um buscasse a mesma afirmação nos olhos do outro. A expectativa do instinto se defrontou com a real epifania, que nos acertou como um tiro no peito: éramos uma farsa, mas fingiríamos até mais adiante. Ao menos até ao sairmos do cinema.
Terminamos o filme, mas ninguém o assistiu. Dois estranhos abraçados, olhando para a mesma tela e fazendo conjecturas sobre as próximas ações. Encontramos amigos. Rimos com o que nos restava. Uma sequência de massagens cardíacas em um relacionamento sem mais chances de sobreviver. Chegaríamos ao sexo se a consciência não nos desse coragem de sentar e derramarmos sobre a mesa as armas que cada um vinha apontando para o outro. Debatemos provas. Apontamos culpados. Julgamos e condenamos mutuamente. Pelos olhos, mágoas transbordaram como água. O fim, objeto de nossa fuga, nos alcança com sua morte, podando qualquer resquício da nossa comunhão. O óbito se faz ouvir em nosso silêncio.

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Nossas falhas apontaram crimes odiosos e que o outro não conseguia suportar. Éramos dois desencontros que se esbarram.

Descanse em paz, mas que não ressuscite.  

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