Teresas de Teresa



"Tereza ou teresa: informal para corda confeccionada com lençóis, cortinas, roupas que é geralmente usada para fuga de sanatórios, hospitais, presídios, etc."


***

Era uma vez... Eram duas vezes... Eram três vezes... Eram tantas vezes que se perdiam entre os numerais. Volátil, sutil, bailarina que desviava das algemas e mágica que escapava das correntes que tentavam lhe por. Nunca se prendeu por muito tempo. Ou melhor: nunca se prendeu.

Teresa era fugitiva nata. Fora anatomicamente desenhada para escapar por aí. Com grandes olhos frios e negros, tal qual câmeras ligadas 24 horas por dia, captavam os movimentos ao seu redor. No menor sinal de perigo, fazia com que seus pequenos pés tocassem o chão mais vezes e mais rápido do que você leu a palavra "palavra". Suas mãos, também pequenas, foram projetadas para não sustentarem por muito tempo responsabilidades, sempre as deixando cair. Quando a ajudavam e colhiam os cacos da decepção no chão, ao voltar os olhos pra cima, Teresa já não estava mais lá. Nos dedos aliança não ficava, fazendo da joia um mero bambolê dourado para anelares. A pele, branca, sedosa e lisa, parecia um sabonete, deslisando da mão dos mais afobados por tê-la. Os ossos eram flexíveis, escorregando por entre os braços de qualquer abraço. A boca detinha um design único, fazendo com que a união das palavras "eu" + "te" + "amo" fosse impronunciável. Por fim, o coração era pequeno o suficiente para dar e receber apenas quantias bem dosadas de amor - nem mais, talvez menos, muitas vezes nada.

E assim era com todos. Até para com os familiares sua frieza reinava soberana, com direito a solidão no quarto com poucas pausas necessárias. Em casa, os parentes chacotavam da situação, dizendo que os pais de Teresa deveriam fazer um banheiro e uma cozinha no quarto da moça, para não perderem tempo na espera de suas pausas. Mas os pais sabiam que Teresa não ficaria no quarto para sempre, nem mesmo nessas condições para solidão "perfeita". Ao anoitecer, jogava a corda feita de lençóis e, mesmo com as grades da janela e a altura em que se encontrava, ela fugia como fez Rapunzel, tendo como destino mais uma noite incerta.

Nos empregos ela não durava muito. Tinha problema com a rotina. Era - ao contrário do que você possa pensar - muito boa no que fazia. Vivia recebendo propostas aqui e acolá, mas tinha na carteira de trabalho mais assinaturas do que qualquer outra moça de sua idade poderia ter. Ama o trabalho que faz, mas ao ver as mesmas caras, os mesmos computadores, as mesmas paredes, joga sua teresa novamente pela janela de qualquer repartição e... puff... já está lá fora novamente.

De amores eu  só sei boatos. Boatos que por toda a cidade, nos corações dos mais diversos rapazotes, há uma teresa que Teresa deixou para trás em sua fuga. Boatos que houveram rapazes que tentaram cercá-la de amores, carinhos, promessas, ilusões, presentes, mas que não tiveram o desejado efeito. Boatos que houveram moços brutos, que a colocavam em torres enormes construídas com ciúme e amor possessivo, crendo que suas teresas não alcançariam o chão, mas que também ficaram surpresos com o resultado. Boatos que poucos realmente conquistaram aquele pequeno coração, mas que os garotos esperavam mais amor do que recebiam diariamente. Boatos que passam rapazes de 5 em 5 minutos na frente de sua casa, perguntando "Teresa, você me ama?" e boatos que de 5 em 5 minutos ela responde "Claro que te amo, meu querido". Mais boato ainda é a história de que no lugar da dona da voz, um rádio toca no repeat a frase, pois ela estaria fugindo dos pretendentes. Muito mais boato ainda é a versão que diz que os meninos sabem disso, mas passam lá para escutar a gravação da voz amada da amada. 

Sobre os ela e os amores, as únicas coisas que eu sei com certeza, caro leitor, é que:

  1. Teresa é assim: fugitiva, não se entrega por completo, não se apega;
  2. e que eu a amo... a amei... bem... eu não sei ao certo. Quando fui expressar meus sentimentos para ela, Teresa já havia escapado.

Teresa me lembra outro personagem que foi mas voltou, bem como quem viu partir e retornar.

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